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São João



No Dia de São João, todas as igrejas do santo daime comemoram com uma grande festa ao aniversário do santo católico.

O PRIMEIRO FESTEJO DE SÃO JOÃO NO DAIME
Em 1935, Mestre Irineu (criador da doutrina do Santo Daime) deu novos contornos ao seu ritual. Nessa época, ele começou a realizá-lo geralmente às quartas-feiras ou aos sábados de cada semana. Às quartas-feiras ocorriam os trabalhos dedicados à cura, já aos sábados os trabalhos eram dedicados à irmandade. Mas, não se pode afirmar que estritamente estas configurações dos trabalhos eram sempre rigidamente seguidas, havendo quartas-feiras quando não se realizavam trabalhos em prol de ninguém e sábados quando se faziam trabalhos de cura. Foi nesse período, que ele também começou a organizar os trabalhos de hinário. O primeiro destes ocorreu no DIA 23 DE JUNHO DE 1935, NA VÉSPERA DO DIA DE SÃO JOÃO, com todos participantes sentados, na varanda da casa de Maria Marques Vieira, esposa de Damião Marques. Vejamos o relato de Percília Ribeiro abaixo sobre esta passagem.
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O primeiro hinário foi na casa da Maria Damião, era muito poucas pessoas nesse tempo. Meu pai ainda era vivo. Então, só tinha dois hinos do irmão Germano Guilherme e dois do João Pereira, cada um tinha dois hinos e o Cruzeiro do mestre tinha apenas cinco. E quando nos chegamos na casa do Mestre eu com meu pai e a nossa família toda, só tinha Lua Branca. Era o hino que tinha, era Lua Branca. Então ele falava que Lua, né. Aí, eu era criança naquele tempo, eu tinha nove anos. (...) Saiu o Tuperci, logo veio o Ripi, eu imaginei assim, eu vou numerar quantos hinos é que vai sair, aí, tive aquela idéia mais foi Deus que me deu aquele dote né. Saiu um, depois saiu outro e depois saiu outro. E eu numerando um atrás do outro né. (...) Quando chegou no São João, ele disse que queria fazer um trabalho de hinário, mas a casa dele era muito pequena e tal. Aí, o finado Damião Marques que era o marido da Maria Damião, ofereceu a casa dele pra ele fazer o hinário. Ele aceitou, aí, nós fomos. Eles cantavam cada hino repetido três vezes pra aumentar, quando chegava no ultimo voltava começava de novo porque era pouco demais. Até quando chegou lá pela onze horas da noite, aí, deu intervalo. Nessas alturas precisava você ver uma mesa repleta, era pamonha, era canjica, era aquele outro que chama pé de moléque ne, era tanta da comida. Passamos a noite né. Depois de tudo fomos cantar novamente. Com nove hinos apenas. Foi até o amanhecer do dia, o primeiro hinário cantado, mas era sentado, não dava pra bailar, além de ter poucos hinos era pouca gente também, né. Foi sentado cada qual nos seus lugares e assim foi realizado. (...) (entrevista com Percília Ribeiro dada Antônio Macedo em 1999).

No festejo descrito acima foram cantados os primeiros cinco hinos de Mestre Irineu, dois de Germano e dois do João Pereira. A seqüência dos primeiros cinco hinos de Mestre Irineu é: Lua Branca, Tuperci, Ripi, Formosa e a Refeição. Este último é um hino cantado fora da “linha hinária”, executado somente em intervalos de hinários, ou antes de refeições, como anuncia o próprio título do hino. Os dois hinos de Germano foram: Divino Pai Eterno e Deus Aonde Está. Os dois hinos do João Pereira foram Fé em Nosso Pai e Papai do Céu. Os hinos geralmente são “recebidos” em verso e melodia. Os trabalhos espirituais com hinários dão início à participação coletiva em uníssono, diferenciando-se desta maneira das matrizes vegetalistas, onde as execuções das canções são geralmente em solo. Os hinos neste momento configuram um novo molde de trabalho, de domínio público, ao inverso dos “chamados” de ordem pessoal, restrita e sujeita a certos tabus. Os hinos se direcionam a matrizes mais cristãs, ainda que os primeiros hinos de Mestre Irineu mantenham uma conexão com antigas matrizes vegetalistas (União do Vegetal). Com a expressão coletiva do grupo, através dos hinários, houve alguns problemas. Muitos de seus seguidores começaram a receber hinos. De espectadores do ritual, passaram a se tornar atuantes, através dos hinos. Assim, apareceram melodias similares a musicas populares da época, letras de hinos com conteúdos da vida cotidiana e etc. Desse modo, Mestre Irineu sentiu a necessidade de criar critérios de análise dos hinos para determinar se eram recebidos ou se eram inventados. No começo do trabalho era ele mesmo quem corrigia os hinos da irmandade, depois ele passou a função para Percília Ribeiro (MOREIRA; MACRAE, 2011, p. 163 e 164).